quinta-feira, 9 de março de 2017

O ALUNO DO SÉCULO XXI

O documento sobre o perfil do aluno do século XXI deveria proporcionar um amplo debate e, pelo contrário, praticamente não transbordou para as comunidades, limitando-se às cúpulas e a alguma comunicação social.
Como entender este silêncio? Quem tem medo da mudança?
Por outro lado, nos círculos apertados onde o documento emanado do ministério até foi minimamente debatido, por exemplo, em alguns canais da TV ou em órgãos hierárquicos institucionais, a questão quase sempre descamba para o pragmatismo anacrónico dos manuais e do modo como se irá implementar a mudança. Parece que se pensa ainda na mudança legislada, fala-se em mais autonomia para as escolas e em outros aspectos práticos, como se se quisesse adiar a mudança!
Como no debate oitocentista do alargamento do sufrágio!... Primeiro, façamos cidadãos cultos que saibam entender bem a política e só depois lhes daremos o direito de voto!
Ora, a mudança implica tão simplesmente que, como disse o ministro da educação, as cabeças dos educadores (docentes ou encarregados de educação) deixem de hierarquizar saberes e ciências e deixem de falar em disciplinas difíceis e disciplinas fáceis, duras e moles!...
E aqui volto a invocar o século XIX, quando se achava que havia artes maiores e menores, ciências matematizáveis e as outras, saberes feitos e saberes incompletos, sendo estes nocivos…
Basta que em cada aula se mude as práticas e que não haja educadores arrivistas a pressionarem para a classificação; portanto, só faz falta muita e boa formação, tanto parental, como docente e, neste caso, reciclando os bafientos centros de formação.
Basta perceber que o ensinar e o aprender não são processos separados e que o saber não coincide com a informação, que o principal papel da escola é a motivação e que cada escola é e tem que ser um centro de formação permanente, que o trabalho colaborativo é muito mais do que a simples cooperação, que a supervisão horizontal é uma prioridade e que avaliar é muito mais do que classificar.
Enquanto um aluno que decora coisas conseguir ter melhor nota do que um aluno que se apropria do verdadeiro saber, enquanto esse aluno for formatado só para o que é necessário e não para o saber global, holístico e, necessariamente problematizante, inacabado, humanista, subjectivo …
De nada servirão os normativos e mais autonomia e projetos e actividades. Recicle-se apenas as cabeças!
Já no século XVIII Verney apelava a cabeças bem feitas, em vez de cabeças bem cheias!
Preparemos o aluno para o fluido e o imprevisto e muitas vezes basta ter em atenção o chamado currículo oculto, por exemplo, evitando a marcação de elementos formais de avaliação!
Introduzamos em cada aula a problematização e o pensamento crítico, sejamos docentes de matemática ou de filosofia!
Procedamos à verdadeira interdisciplinaridade, em vez de apenas perguntarmos apressadamente que temas são comuns a cada disciplina!
Aprofundemos a história local, mesmo sem ela estar no programa!
Apostemos nas competências, na mobilização de saberes, na capacidade de construir e de aprender…
Isso está na nossa mão, independentemente de mais autonomia, de novos manuais … eu diria mesmo, fim aos manuais! Podemos mudar o paradigma, mesmo com os mesmos programas, desde que se perceba o que é cumprir um programa e isso passa pela rejeição da visão quantitativa e atomística.
Apostemos no aluno, na crença de que não há os inteligentes e os não inteligentes. Só há os  motivados e os desmotivados! E a motivação que conta é a intrínseca...

Oiçamos Morin, Gardner e tantos outros!